Nota do blog: entrevista concedida ao Jornal da Tarde, de São Paulo,
em 7 de dezembro de 1966, ao jornalista José Maria de Aquino.
Acervo particular |
ESSA
FAMÍLIA NINGUÉM VAI PODER ESQUECER
A Avenida Aymoré Moreira e a Rua Alfredo Moreira
Júnior, o Zezé do Corinthians, ainda não foram inauguradas em Miracema, estado
do Rio: Zico e Filinho, os irmãos de quem a cidade esqueceu os apelidos do
tempo de criança na hora de homenagear, não encontram tempo fora do futebol
para ver o prefeito gravar seus nomes nas duas placas. Agora, os 26 mil habitantes
da cidade vão ter que esperar um pouco mais porque os Moreiras mais velhos
acham que o caçula Aírton já merece também a sua homenagem. É Aymoré quem diz:
- Qualquer dia vai botar o nome dele numa praça.
Quando chegar o dia de Aírton, o Teté, que saiu de
casa mais novo que os outros, os três Moreira prometem estar juntos num
encontro que sua profissão quase não permite. Zezé, Aymoré e Aírton – três irmãos que
fizeram nome num futebol detestado pelo pai Alfredo – Só se encontram quando esse mesmo
futebol deixa. Ontem foi dia de um desses encontros, cinco anos depois.
Numa mesa do restaurante do hotel Normandie, Zezé, o
mais velho, perdeu um pouco de seu ar sério para contar casos que seus 58 anos não
o fizeram esquecer. Aymoré, o do meio,
também lembrou coisas de Miracema, não parou de falar em seu sítio e sua
fazenda. Aírton, onze anos mais novo que Zezé, riu meio sem graça dos casos
antigos, dos quais nem participou, era muito novo ainda. Preferiu conversar mesmo do futebol que agora
o torna tão conhecido como os irmãos, apesar de um acordo que os três dizem
ter:
- Quando nos encontramos não gostamos de falar de
futebol. Cada um tem seu trabalho, sua responsabilidade à parte.
Mas durante o almoço, ao qual Zezé, com a esposa Maria
Helena, chegou quase no fim, não conseguiram ficar muito tempo sem falar de
táticas, torcidas ou jogadores.
Alfredo Moreira da Silva, farmacêutico rico em
Miracema no tempo dos mil réis, jamais gostou de futebol. Zezé, Aírton e Aymoré
dão risada quando dizem:
- Papai não podia ver futebol nem de longe, detestava.
O Zezé mesmo já correu muitas vezes para
não apanhar quando jogava bola escondido.
Aírton e Aymoré comeram lombo de porco com fritas, os
três se olharam na hora do café para lembrar que precisam usar Dietil, estão
engordando. Nenhum achou que os outros
mudaram de cinco anos para cá, Zezé continua com seu ar sério, Aymoré ganhou
mais um pouco de cabelos brancos, ainda tem muitas piadas para contar. Aírton é
sempre o mais gordo, não perdeu o jeito de ser que pegou dos mineiros.
Mas ele, auxiliar de Zezé no Fluminense, em 53,
auxiliado logo depois por Aymoré no Bangu, dono de uma vida mais tranquila que
os irmãos em Belo Horizonte, mudou muito no mundo do futebol, que os Moreira escolheram para viver. Só Aderbal, o outro irmão, 50 anos, preferiu
outro caminho, é saxofonista conhecido, viajou por quase todo o mundo.
Único avô dos três, Aírton fala mais do filho mais
moço, Júlio, 19 anos, sobrinho preferido
de Zezé. Parece um pouco com o menino Filinho, tem gênio igual ao tio
quando era moço, gosta de confusão. Estudava no colégio Santo Agostinho em
Minas, colocou um tijolo no capuz de um dos padres da escola. Joga bem futebol e foi eleito o melhor jogador
do Santo Agostinho. Uma semana antes da festa dois padres foram procurar Aírton: “Pelo amor de Deus não deixa Júlio ir à festa senão ele quebra tudo”.
Zezé e Aymoré se divertem com as histórias de Júlio, mas
são capazes de discutir a sério o time do irmão – futebol moderno, diz Aymoré e
ele mesmo completa:
- Agora que Aírton é técnico famoso, a gente até
esquece a desilusão de vê-lo desistir dos estudos. Queríamos que ele fosse um
homem de nome na vida. Eu e o Zezé já
estamos na hora de parar, é bom assim. O nome Moreira nunca vai ficar
esquecido.
E as ruas até hoje não receberam as placas. Cidade sem memória
ResponderExcluirBeleza de te ti, já conhecia.
Memória porque? Nunca fizeram ABSOLUTAMENTE NADA por Miracema. Sequer foram enterrados aqui!
ResponderExcluirRespeito a sua opinião, meu caro anônimo. É uma pena que não tenha se identificado, pois o blog é democrático e não é dono da verdade. A história deles é muito bonita e acho que não tinham que fazer nada por Miracema para serem lembrados, nem que fosse com um nome de rua, o que ainda é muito pouco.
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