domingo, 17 de julho de 2016

POR QUE VEMOS A FINAL DA EURO NA TV ABERTA E NÃO VEMOS A DA COPA AMÉRICA? POR GABRIEL ROSTEY


No último domingo Portugal e França fizeram a final da Eurocopa e os brasileiros tiveram a oportunidade de ver esta partida ao vivo na TV aberta, Em mais de um canal, inclusive, já que Globo e Band transmitiram com grande destaque, a tal ponto que a “Vênus Platinada” escalou seu principal narrador, Galvão Bueno, e mais: escanteou a rodada do Campeonato Brasileiro, passando os jogos Chapecoense x Corinthians e Coritiba x Botafogo para o sábado, para deixar o domingo reservado ao confronto europeu.

Assim, os brasileiros puderam acompanhar a inédita conquista portuguesa, a montanha-russa de sentimentos de Cristiano Ronaldo e o golaço de Éder, o que gerou inclusive festejos da numerosa comunidade lusitana no País.

Acho muito bom que os brasileiros acompanhem o esporte mundo afora, vendo partidas importantes que não envolvam somente o time do coração ou a Seleção Brasileira. Isso é parte importante para que amadureçamos nosso entendimento sobre futebol, ao contrário do próprio tratamento costumeiramente dado ao futebol na TV aberta, quase sempre apelando à paixão do torcedor.

Por isso mesmo é que não só lamento, como fico profundamente irritado que os brasileiros não tenham podido viver o mesmo com a Copa América Centenário, por exemplo. Que não tenham podido acompanhar o drama de Messi e a sua decisão de abandonar a Seleção Argentina, um momento marcante do futebol. Que não tenham visto a epopeia chilena – que vive a melhor fase de sua história – nem mesmo o desenvolvimento de uma competição da qual participou a Seleção Brasileira.

O mesmo acontece com a Copa Libertadores, que teve uma semifinal “secreta” entre a surpresa Independiente Del Valle e o gigante mundial Boca Juniors, e fatalmente terá uma decisão ainda mais ignorada pela nossa “grande mídia”, entre os surpreendentes equatorianos e o Atlético Nacional de Medelim. Nem preciso dizer a repercussão que a fase decisiva da Champions League tem por aqui.

E não estou negando a evidente diferença de organização e repercussão entre as competições europeias e as americanas. Acontece que nós estamos nas Américas, e essas competições continentais merecem grande repercussão por aqui e geram grande audiência. Como a Copa América Centenário pode render matérias e mais matérias enquanto o Brasil está vivo na competição, e depois da nossa eliminação subitamente virar uma competição menor? E a Libertadores, objeto de desejo de todos os nossos clubes, que gera ótimos índices de audiência na TV e lota estádios Brasil afora, passar a ser desimportante quando não podemos mais ganhá-la?

Não desconsidero que a UEFA faz uma coisa elementar nas negociações de transmissão de suas competições: obriga que a emissora exiba algumas partidas, incluindo uma semifinal e a final. Não consigo conceber nem que uma emissora se interesse por um campeonato e não tenha o respeito de transmitir sua final, quem dirá de uma entidade organizar uma competição, vender seus direitos de transmissão e não EXIGIR que transmitam ao menos a final. Mas apesar de tão óbvio, a Conmebol não o faz.
Mas além disso, acho que tem um componente brasileiro de um certo “espiritismo de porco” de desvalorizar o que não podemos conquistar. Então, se somos eliminados de um campeonato, nada melhor do que tirar a luz sobre ele para que toquemos a vida e deixemos para trás qualquer frustração.

O problema é que graças a isso, continuaremos sempre tratando as demais equipes do continente como lixo. Adorando que o Leicester City seja “a deliciosa zebra inglesa”, mas achando deprimente ver o Del Valle na final da Libertadores. Exaltando que “País de Gales faz história ao chegar às semifinais da Euro” (aliás, tudo era histericamente “histórico” na Euro), mas ignorando que o Chile (que, para mim, é claramente superior a Portugal) está fazendo história ao ser a seleção hegemônica das Américas.

Assim, sempre continuaremos perdendo e ganhando de “ninguéns”. O valor de qualquer vitória estará meramente na taça; quando ela não vem, não tem mais nada a ser contado.


Se nós não valorizarmos nosso universo futebolístico, ninguém mais poderá fazer isso. Se não o fazemos por ver valor de fato (como eu sinceramente vejo), façamos ao menos por estratégia e interesse próprio, senão estaremos cada vez mais fadados a só vermos “história sendo feita” do outro lado do mundo.

Gabriel Rostey é colunista do site NO ÂNGULO. 

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