Com a ausência dos
representantes dos três poderes municipais: Prefeito, Presidente do Legislativo
e do Juiz da Comarca - este por residir em Niterói não se encontrava na cidade
- visitou o município de Miracema no dia 26
de novembro de 1967, o ex-presidente da Republica Sr. Juscelino Kubitschek
de Oliveira (1902/1976), que atendeu o convite formulado pelo advogado Mauricio
Monteiro quando se encontrava em Paris e ali fez-se amigo do político mineiro.
A presença do ex-presidente
em Miracema foi vigiada por policiais do SMI e do DPPS, que juntamente com as
chuvas tiraram muito do brilhantismo das solenidades e das manifestações
populares, sem, no entanto, se constituírem empecilho para a explosão de
alegria que dominou os milhares de cidadãos que ali compareceram para
homenagear o ilustre visitante. Foi recepcionado no campo de aviação, aonde
chegou às 16:00 horas do domingo, num “Cesna” de 6 lugares. Regressou ao Rio às
08:00 da manha de segunda feira.
CARIDADE
O convite do advogado Mauricio Monteiro ao senhor Juscelino Kubistechek visou a
dar ênfase à campanha para o Asilo São Vicente Paula, que foi beneficiado com
toda a arrecadação decorrente das festividades programadas e nas quais o político
compareceu, juntamente com a “Miss” Estado do Rio, Maria da Graça Kouri. O ex-presidente
além de percorrer as instalações da instituição de caridade compareceu ainda ao
jogo de futebol entre as equipes do Floresta, de Cambuci, e do Miracema, cuja
partida terminou empatada em 1 a 1.
O Sr. Juscelino
Kubitschek foi, posteriormente, ao baile do Aero Clube, onde valsou com a mais
bela fluminense tendo em seguida dançado com damas da sociedade miracemense. No
intervalo do baile o Deputado Nicanor Campanário, única autoridade do município
que não se afastou da cidade, fez um discurso no qual agradeceu o Sr.
Kubitschek a honra que concedia a Miracema lembrando que em outras
circunstancias já haviam estados juntos e que aquela região e o Brasil eram agradecidos
ao ex-presidente. A primeira quando autorizou a encampação da Companhia Força e
Luz Norte Fluminense, beneficiando Miracema, a segunda pela desapropriação da
Cachoeira do Inferno, um benefício ao estado e a terceira, quando concedeu a
anistia aos revoltosos de Aragarças, após ter sofrido uma série de restrições
em decorrência do Estado de Sitio em que o país se achava mergulhado,
culminando seu Governo com a passagem da Faixa Presidencial, dando à democracia
o mais exato sentido, que uma Nação sempre esperou dos homens públicos. O primeiro
secretário da Assembleia Legislativa ressaltou que esta última atitude do ex-presidente
foi um exemplo à Nação Brasileira. Os deputados José Kezen e Álvaro de Almeida
também se encontravam na recepção ao ex-presidente.
RECEPÇÂO
Na
residência do Sr. Adumont Monteiro, último presidente da UDN, ao Sr. Juscelino
Kubitschek foi ofertado um jantar que teve apenas 30 participantes. O
anfitrião exaltou a presença do ex-presidente que em seguida agradeceu a
manifestação e o carinho recebidos. De política o Sr. Kubitschek falou apenas que há necessidade de criação de um
terceiro partido afim de que não radicalizem as duas correntes partidárias
existentes. De sua aliança com o Sr. Carlos Lacerda disse que é um imperativo
da paz nacional e sobre a Frente Ampla disse que ia muito bem obrigado.
O COMEÇO
Essa visita de Juscelino Kubitschek de Oliveira a Miracema, só foi possível porque Mauricio Monteiro, em término do curso de Direito na Universidade Federal Fluminense, com um grupo de estudantes que, ao invés de participarem das festas de fim de ano, decidiram gastar o dinheiro indo a Paris. Lá, sabendo que Juscelino estava na Capital das Luzes, após a cassação em 8 de julho de 1964, que lhe tirou os direitos políticos por 10 anos, o grupo decidiu fazer-lhe uma visita. Muito cortês Juscelino recebeu o grupo, mas com arguiu (perguntas) sobre o Brasil. Só Maurício fez um relato, inclusive dos acontecimentos políticos, e o ex-presidente disse-lhe que, ao retornar ao Brasil, faria uma visita a Miracema, "para tomar um café". Quando ele retornou do exílio, Maurício foi ao Rio, conversar. E, no trajeto de sua casa em Ipanema até uma clínica em Botafogo, o advogado e o ex-presidente tiveram uma conversa agradável, na qual ele convidou para dançar num baile na cidade. Maurício Monteiro pediu ao presidente do Rotary local, advogado Roberto Ventura, que formulasse, em nome da entidade, um convite ao ex-presidente. "Peguei o convite e, com Maria das Graças Kouri, Miss Estado do Rio fomos convidar Juscelino”. E ele aceitou. Então, o Rotary assumiu a organização da visita, tendo Maurício sendo alvo até de ironias porque ninguém acreditava que a convite seu um homem daquela projeção visitasse Miracema. Todavia, temendo represálias por parte da ditadura militar e, demonstrando muito medo, o prefeito José Carvalho, os vereadores, o presidente da Câmara, Inácio Pires da Silveira, promotor, juiz e outras autoridades sumiram da cidade. Ao mesmo tempo os geradores que reforçavam a iluminação da cidade foram desligados.
Estes fatos não constam das biografias do ex-presidente nem foram divulgados pela grande imprensa. Mas foram importantes, porque Juscelino estava vivendo momentos terríveis, com o afastamento de muitos dos seus amigos, com as pressões militares, a censura aos órgãos de comunicação que também não o entrevistavam. Sua angústia, confessada, era grande e ninguém o convidava para participar de atos públicos como o que ocorreu em Miracema. Inclusive, Juscelino mandou um emissário procurar Mauricio e, com ele, foi à fazenda Prosperidade, em São José de Ubá. Estava tudo acertado para Juscelino ficar na fazenda, caso se confirmasse o aumento da repressão, como de fato, ocorreu, com o AI-5. Mas não houve tempo e Juscelino foi preso.
Em 1988, Márcia Kubitschek esteve em Miracema recebendo um título de cidadania Miracemense, em nome de seu pai, ocasião em que ficou na casa de Mauricio Monteiro. Coincidentemente, no mesmo quarto em que dormira seu pai, 21 anos antes. Em 1995, Mauricio vai a Brasília e visita o Memorial JK, tendo conversado com a Sra. Sarah Kubitschek e relembrado alguns fatos, que a emocionaram.
ECOS
DO PASSADO Nº 46, PUBLICADO POR JOÃO BAPTISTA FONSECA.
FONTE:
Jornal Dois Estados
Folha do Norte Fluminense
Fotos: Arquivo pessoal do Dr. Mauricio Monteiro