Quem não conhecia o Major Emiliano, lá das bandas do Belo Monte, que
trabalhava na Fabrica de Tecidos? Já velho, magro, baixo e bem moreno, sempre
de chapéu e cavanhaque usava um guarda chuva para esconder uma hérnia volumosa.
Do seu escritório via o pomar de sua chácara cheio de árvores frutíferas que
ele sempre plantava, assim como, roseiras e madeiras nobres que davam boa
sombra e bons frutos. No período em que permanecia em sua chácara aproveitava o
tempo para cuidar da floresta que crescia em volta da casa.
Um belo dia chega Cícero, meu pai, amigo de longa data para visitá-lo.
Logo veio aquele abraço fraternal e começaram a conversar sobre os velhos tempos
da mocidade. Como o dia estava ameno, resolveram dar uma volta através da mata
e sentir o cheiro da relva e do mato verde, pisar sobre as folhas secas com os
pés descalços, catar gravetos para alimentar o fogão à lenha onde fazia broas
de fubá. Foram caminhando sem sentir o tempo passar, enquanto o Emiliano ia
enumerando os nomes das árvores que havia plantado. Passaram pelo lago
cristalino e beberam aquela água que borbulhava da nascente. Lavaram o rosto e
os pés descalços pisando folhas do mato verde, sentiam as sombras dos
arvoredos. Um dia inesquecível! O visitante estava feliz. Nunca tinha passado
um dia tão agradável e de tanta paz ao som do canto dos pássaros e dos insetos.
Passou a observar aquelas árvores, notou que muitas estavam tortas, outras
pequenas demais, perto de grandes árvores. Outras com galhos no chão e raízes
fora da terra, à mostra. Árvores velhas e novas, árvores entrelaçadas em
outras, árvores abrigando parasitas, árvores isoladas, árvores morrendo e
outras em pleno frescor.
O amigo Cícero desacostumado a andar no mato, ao ver de perto as
diferenças produzidas pela natureza, pergunta ao Emiliano qual a explicação
para tantas diferenças entre elas, que foram plantadas com o mesmo carinho e
pela mesma pessoa?
O velho Emiliano respondeu: – A floresta meu irmão, pode ser comparada
com a sociedade em que vivemos, ou melhor, um clube social, uma sociedade
religiosa, um exército, enfim, com a humanidade. E continuou... essas retas e
altaneiras correspondem às pessoas que procuram fazer tudo certo, isto é,
dentro da lei. Essas carregadas de bons frutos são pessoas caridosas que estão
sempre dispostas a oferecer algo ao seu semelhante.
Aquelas secas, sem frutos e flores, sem sombras, representam pessoas que
não lutam para crescer e prosperar, e acomodam com o pouquinho de luz que lhes
sobra e vão vivendo. Aquelas esguias que se intrometem entre as mais velhas e
fortes são as pessoas que procuram amparo, que querem vencer e se apegam entre
as mais fortes, brigam por um lugar ao Sol e logo conseguem. São vencedoras.
Aquelas tortas, fora dos eixos de equilíbrio, querem vencer a qualquer custo,
indo procurar luz em outro ponto e caem com a força do vento por estarem
desequilibradas. Querem alcançar o sol de qualquer maneira e fracassam. As
baixinhas embaixo das grandes são acomodadas e querem sempre estar na sombra
das outras e não crescem. Não morrem, mas não são felizes.
Cícero, o visitante, teve que partir. Agradeceu a acolhida, abraçou o
velho Emiliano e saiu pensando alto: “Esta floresta parece com Miracema, a
nossa cidade. Muitos altaneiros, outros acomodados, alguns estudiosos. Vários
sem vontade de aprender. Tantos vencendo pelos próprios méritos. Outros
querendo algo sem fazer por merecer. Todos miracemenses, todos nascidos na
mesma cidade, todos recebendo os cuidados do mesmo chacareiro. Paciência, não
há como mudar!”
Vamos recolher a lenha seca, limpar os caminhos, proteger as nascentes
desta Miracema, uma bela cidade, para que possamos continuar possuindo flores
perfumadas, frutos saborosos, árvores frondosas e palmeiras seculares. Miracema
é uma grande floresta.
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