Nota: matéria assinada por Gian Amato,
publicada no jornal O Globo em 09 de dezembro de 2007, com fotos de Jorge
William.
Sentado diante da entrada do estádio
Antonio Ferreira de Medeiros, o técnico Mário Marques dá uma entrevista, mas
não tira os olhos de um campinho de terra, onde marrecos batem bola. Aos pés do
Morro dos Cabritos, no meio da cidade, e da estátua do Cristo Redentor, que
divide opiniões, contava como levou o Cardoso Moreira Futebol Clube à Primeira
Divisão, fato inédito que pôs o município no mapa, quando chega um garoto magro
dirigindo um velho Gol branco. Ele salta do carro e pega do banco traseiro um
pesado pacote embalado em saco plástico:
- É a carne do time, posso deixar
aqui? – perguntou ao presidente do clube, Alexandre Cozendey.
A contribuição de cada marreco, como
os 12.595 habitantes de Cardoso Moreira são conhecidos, foi fundamental, tanto
para o voo do time rumo ao topo do futebol carioca quanto para manter a cidade
na superfície. Encravada em um vale a 350 km do Rio, à beira do Rio Muriaé,
Cardoso só não afundou por um milagre. As constantes enchentes (daí o apelido)
estão marcadas nas paredes, que não são pintadas há décadas para provar o nível
que a água atingiu. Para não depender dos céus, moradores passaram a construir
casas de dois andares.
- Nem imaginava que Cardoso Moreira
existia. Vim conhecer a cidade quando a proposta surgiu e acabei ficando. Afinal,
uma coisa me intrigava. Por que fazem tantos terraços? Descobri que era para
fugir das águas – disse Mário Marques.
Marreco ilustre da cidade, o prefeito
Renato Jacinto (PMDB) inspira corações e mentes cardosenses. Ninguém admite ser
puxa-saco, mas dizem que ele era craque na década de 1980. Jogou o amistoso
contra um combinado de ex-campeões mundiais pela seleção brasileira. Entre
eles, um craque que também tinha nome de ave: Garrincha.
- O juiz apitou e ele correu para a
ponta direita. Passei 90 minutos sem ir até lá. Só assim evitei de levar uma
tremenda humilhação.
Menos, prefeito. Afinal, Garrincha
estava em fim de carreira. E Renato parou pouco tempo depois para seguir o
sonho político. Há 18 anos, ele participou do processo pela emancipação de
Cardoso Moreira do município de Campos, cidade do rival Americano, principal
força na Região Norte. Com a ajuda da fama que fez no futebol, ganhou a
admiração e os votos da população, que o elegeu prefeito pela primeira vez em
1992.
CIDADE TEM O TERCEIRO PIOR IDH
Na elite do futebol, Cardoso Moreira
seria rebaixada no Índice de Desenvolvimento Humano. A cidade é a antepenúltima
colocada no ranking do Estado, na 89ª posição. Só perde para São Francisco de
Itabapoana (90) e Varre-Sai (91). Na classificação nacional, é apenas o 2.895º.
Talvez seja por isso que a maioria dos habitantes homens enxergou no Cardoso,
em diferentes momentos da existência do clube, a chance para melhorar de vida.
- Comecei em 1955, mas tive que parar
e cortar cana e café para sustentar a esposa – recordou Luiz Antônio da Silva,
carteirinha de jogador da época nas mãos castigadas pelo trabalho na roça. –
Salvei o casamento e a minha vida.
O tom de premonição no discurso do
ex-lateral fica por conta da lembrança da maior tragédia do clube. No final da
década de 50, um caminhão trazia os jogadores de uma partida em Itaperuna
quando tombou na estrada que hoje é uma rodovia federal. Parte do time morreu,
a outra ficou mutilada e o clube entrou em luto profundo.
Foi preciso passar muitos anos e
muita água do Rio Muriaé por baixo da Ponte do Outeiro para purificar a equipe,
que, em menos de dois anos, venceu a Terceira Divisão e vai chegar entre os
quatro primeiros da Segundona, assegurando a classificação. Junta-se ao
Mesquita, Macaé e Resende. Os dois últimos também chegam pela primeira vez. O
Campeonato Estadual de 2008 será disputado por 16 clubes, sendo seis da
capital: o menor percentual em 20 anos. O Olaria disputa, na repescagem, a
quinta vaga.
A festa do interior, promovida pelo
presidente da Federação de Futebol, Rubens Lopes, em troca de apoio, não garante
a qualidade do espetáculo e obriga os pequenos a disputarem jogos com os grandes
em estádios da capital.
Pelo menos, as equipes subiram com
suas próprias forças. E uma ajudinha das prefeituras. O prefeito de Mesquita,
Arthur Messias da Silveira, por exemplo, investiu R$ 80 mil. Renato Jacinto
garante que só contribui com R$ 2 mil mensais para a folha salarial de R$ 22
mil. Além do dinheiro, abre as portas do Barracão, seu restaurante, para Mário
Marques e a diretoria comerem. Em sua moto, Cozendey costuma carregar até lá o
diretor Emerson Papa, que vai ao lado, de bicicleta. Os jogadores comem
separados, nas duas casas alugadas que servem como concentração, ansiosos pela
hora de fazerem parte do filé mignon do futebol carioca.
Uma das casas alugadas pelo clube.
Minhas considerações...
Na Taça Guanabara de 2008, o Cardoso
Moreira ficou em 7º entre os oito do Grupo A, com duas vitórias; um empate;
quatro derrotas; nove gols pró; dezenove contra.
Na Taça Rio ficou em 8º (último), com
dois empates; seis derrotas; seis gols pró; quatorze contra.
Sendo assim, na sua primeira e única experiência na série A, o time
ficou na última colocação e acabou rebaixado à Série B juntamente com o
América.
Em 2009, realizou campanha apenas regular, conseguindo
se manter na Série B.
Em 2010, se licenciou das disputas profissionais.
Em 2011, o clube negou-se a disputar o Grupo X, também
denominado torneio da morte, e acabou punido e rebaixado à terceira divisão
pela Federação juntamente com Itaperuna e Aperibeense.
Desde então, o Cardoso Moreira se licenciou das
disputas profissionais.
No ano corrente o Cardoso Moreira
disputa a Super Copa Noroeste, torneio amador no Noroeste Fluminense.
Parabéns pela transcrição da reportagem. É muito legal esses causos que demonstram o quão é difícil fazer futebol profissional em nosso país. Aqui de Fortaleza tem um fã de seu blog e postagens nas redes sociais, e que continue a nos proporcionar matérias do tipo. Abraços de Antônio Carlos
ResponderExcluirObrigado e participe sempre!
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