Até meados de 1953 o nome mais famoso das Américas era
de um cavalo, o argentino Gualicho. Ele conquistou uma façanha, até hoje não
igualada: venceu o Grande Prêmio São Paulo e o Grande Prêmio Brasil em 1952 e
repetiu a proeza em 1953. Nenhum outro cavalo sequer igualou essa marca,
vencendo os dois maiores prêmios do turfe sul-americano, por duas vezes
consecutivas. Ao mesmo tempo, em General Severiano, surgia um jovem, super
tímido, quase caipira, trazido pelo zagueiro Arati, após vê-lo barbarizando em
jogos regionais, pelo time do Pau Grande FC, em Raiz da Serra, próximo a Magé,
Estado do Rio. Ninguém levava fé na descoberta do Arati, principalmente porque
o garoto tinha uma deficiência nas pernas, com joelhos visivelmente entortados,
da direita para a esquerda, parecendo até dificultar para ficar em pé ou
caminhar normalmente. Logo no primeiro treino, atuando pelos reservas, sabe
quem o rapazinho teve pela frente? Simplesmente Nilton Santos, maior lateral
esquerdo do futebol brasileiro e mundial, de todos os tempos. Em poucos
minutos, o pontinha folgado deitou e rolou, dando dribles desconcertantes no
famoso "Enciclopédia", a ponto de Nilton Santos pedir ao treinador,
Gentil Cardoso, para que tirasse aquele moleque da sua frente, fazendo quase um
apelo "nunca mais me bote prá marcar esse pirralho"! Imediatamente,
Gentil Cardoso passou o garoto para o time titular e, daí em diante, jamais
Nilton Santos enfrentou o rapaz, mesmo durante os treinamentos...
Agora, voltando à manchete dessa matéria: o quê tem a ver
o Gualicho (cavalo) com o Garrincha (ponta-direita)? Tudo! Ainda em 1953, ao
estrear no time principal, em jogo contra o Bonsucesso, o ponta Manoel dos
Santos foi chamado, pela maioria dos narradores, pelo nome de Gualicho, achando
que o apelido do jogador era uma espécie de homenagem ao cavalo campeão
argentino. Eu mesmo, quando trabalhei na Emissora Continental, de 1963 a 1965,
nos arquivos carinhosamente organizados pelo Agostinho Olivato Neto, cheguei a
ouvir narrações de locutores da época, entre eles o Oduvaldo Cozzi e o Antônio
Cordeiro, a maioria descrevendo lances criados pelo Gualicho, enquanto outros
locutores, especialmente Waldir Amaral, já identificavam o jogador pelo apelido
correto, Garrincha. A dúvida só foi desfeita quando Geraldo Romualdo da Silva,
editor do Jornal dos Sports, recebeu o jogador, na redação do "cor de
rosa", para uma entrevista esclarecedora. E o próprio Manoel Francisco dos
Santos revelou que seu apelido era homenagem a um pássaro, Garrincha, e que não
tinha a menor idéia de quem era o cavalo Gualicho. (Acrescento, por minha
conta, que o Gualicho deve ter sido o primeiro "João" do Garrincha!)
Detalhe: no jogo em que fez sua estréia oficial no
Botafogo, dia 19 de julho 1953, no campo do Bonsucesso, contra o time da casa,
o alvinegro goleou por 6x3. Dino da Costa fez 2 gols e Vinícius fez um. Esses
dois, pouco depois, foram para o futebol italiano, praticamente iniciando o
êxodo de jogadores brasileiros para o futebol europeu. Na vitória por 6x3 sabe
quem foi o artilheiro? Garrincha, com 3 gols.
O primeiro deles cobrando penalty, mostrando desde
logo que tinha personalidade. Muita gente, inclusive que trabalha atualmente no
meio esportivo, nem passa pela cabeça que, durante algum tempo, Garrincha foi
Gualicho... ou que Gualicho foi Garrincha! Os dois até hoje, jamais foram
superados, em seus respectivos "templos sagrados", os hipódromos e os
estádios de futebol. Entre eles havia uma única diferença: o argentino era um
quadrúpede fantástico, espetacular, formidável, garboso, enquanto o brasileiro
era um bípede genial, incomparável, apaixonante, inesquecível!
Na época, o Corínthians foi campeão paulista de 1951, 52 e 54, além de ganhar o torneio Rio_São Paulo. Por causa disso, ganhou o apelido de Gualicho em homenagem ao cavalo argentino.
ResponderExcluirEu ouvi, acho que pela antiga rádio Continental, em 1953, quando Cozzi transmitia um jogo no Maracanã e foi chamado por um locutor que acompanhava o jogo em Teixeira de Castro: "Cozzi, Cozzi, está estreando um ponta aqui no Botafogo que é um demônio. Dribla todo mundo, já fez dois gols até agora. Acho que o apelido dele é Gualicho".
ResponderExcluirTadeu, já escrevi uns três ou quatro artigos sobre Garrincha, inclusive esse jogo de estreia contra o Bonsucesso, em 1953, em meu blog. Se tiver interesse, é calfilho.blogspot.com
ResponderExcluirVou dar uma conferida.
ExcluirPara facilitar tua busca: "Os três minutos"; "Coisas de gênio" e "Heleno... Garrincha...", os três fazendo parte de um livro que publiquei.
ResponderExcluir