quinta-feira, 7 de dezembro de 2023

ROBERTO DINAMITE – O SONHO RUBRO-NEGRO

 

                                                                                                    Fotomontagem 

Nota: transcrito na íntegra da revista FATOS & FOTOS/GENTE, de 1980, com reportagem de Eduardo Lacombe.

 

Junho de 1978. Local: Estádio Mar del Plata, no famoso balneário argentino, horas depois da partida entre Brasil e Áustria, cujo resultado – 1 a 0 pro Brasil – classificou nossa Seleção à segunda fase da Copa do Mundo. As cabines de rádio e TV estão vazias. Nas arquibancadas, apenas o pessoal da limpeza que, com uniformes trazendo a inscrição Mundial de La FIFA, recolhem os restos de papel e cigarros que o vento ajuda a espalhar.

 

No centro do campo, já bastante estragado, dois homens caminham lado a lado, tranquilamente. O mais velho é o médico da delegação, Lídio Toledo. O mais novo está chorando. Trata-se de Roberto Dinamite, que marcou o gol que classificou o time, dando um pouco mais de calma à agitada cúpula da CBD.

 

Roberto chora. Lídio Toledo entende o por quê. Minutos antes conseguira que ele fizesse o antidoping e colocasse, em um vidrinho, um pouco de urina. Foram necessárias duas garrafas de cerveja. Só naquele momento, Roberto estava se descontraindo. As lágrimas corriam calmamente, dando um pouco de alívio a um jogador que chegou a ser desprezado. Dias depois, meio tímido e entre sorrisos, ele confidenciaria:

“Naquele momento, tive vontade de correr para o telefone e dizer à Jurema: ‘Conseguimos! ’ Mas só vim a fazer isso à noite, na concentração. Foi um momento incrível! Inesquecível!”

 

No dia seguinte ao da partida contra a Áustria, o mundo inteiro comentava que Dinamite classificara o Brasil. Dois anos depois, o mesmo grito – Dinamite! – foi ouvido nas arquibancadas do já lendário estádio do Barcelona, o Nou Camp. Roberto, em sua estreia na equipe espanhola, fez dois gols e saiu de campo sob delírio de uma das mais exigentes torcidas da Europa. Entretanto, um mês depois, o mesmo jogador deixava o campo, aos 10 minutos do segundo tempo, debaixo de vaias.

 

Em casa, naquele momento, sua esposa Jurema pensava:

“Aqui, ele vai morrer. Tenho que levá-lo de volta ao Brasil.”

 

A oportunidade surgiu com a proposta feita por Márcio Braga, presidente do Flamengo, que sonhava reunir em sua equipe a dupla de ouro do futebol carioca: Zico e Roberto. No Rio, ele já afirmara: “Com Roberto, seremos campeões dez anos seguidos. E haja taça para comemorar.”

 

Dinamite, apelido que ganhou de Aparício Pires, no Jornal dos Sports, sempre foi um atacante perigoso.  Não foram poucos, entretanto, que afirmaram: “Mais perigoso que Roberto, só sua esposa, Jurema, no momento de uma renovação de concreto”. Em março do ano passado, em entrevista à Manchete Esportiva, quando o acerto entre Roberto e Vasco estava difícil, ela dizia:

“Hoje, falam de mim. Mas se esquecem que na época da Copa do Mundo, quando ele teve problemas, fui eu quem o ajudou a contorná-los. Coutinho não escondia que Roberto seria sua última opção para o ataque. Tínhamos problemas em casa e tudo isso o perturbava. Mas eu não o deixei desanimar.”

 

Um ano depois, ela justificaria à FATOS & FOTOS/GENTE o porquê de sua conduta, afirmando em alto e bom tom:

“A vida de um jogador não é mole. É preciso que ele tire o máximo em cada contrato. Sei que muitos afirmam que ele não discute nada. É mentira. Tudo é conversado entre Roberto e eu. Não faço nada com o qual ele não esteja de acordo. Luto, apenas, para que ele tenha tudo.”

 

E nesse tudo estaria, com certeza, o retorno ao Rio. Para o Flamengo, mais precisamente, já que no Vasco – para quem o Barcelona tentou devolvê-lo – não há mais ambiente para o jogador. O próprio Márcio Braga, na tentativa de comover os torcedores do Rio da necessidade de trazer Roberto, chegou a comentar:

“No Barcelona ele vai morrer. Será enterrado em caixão de ouro, é verdade. Mas vai morrer.”

 

Durante duas semanas, Roberto e Jurema viveram a expectativa de arrumar as malas e desembarcar no Rio. E nos planos de toda a diretoria do Flamengo, sua estreia estava prevista nos mínimos detalhes: Roberto não posaria com a camisa nove do time. Esse privilégio seria dos torcedores que pagassem o ingresso do jogo cuja renda já estava prevista em torno de Cr$ 20 milhões, incluídos os direitos da televisão (dizem que a Globo já os comprou).

 

Mas o que Márcio e o próprio Roberto não esperavam é que mesmo antes de assinar seu contrato, Roberto já apareceria com a camisa do Flamengo, em uma montagem, nesta página. A imagem é ótima. Faz sonhar todo mundo. O Flamengo paga o que Roberto quer. Márcio e Jurema já acertaram tudo. O Barcelona aceita receber o que o Flamengo quer pagar. Diz Márcio que os detalhes são mínimos. Então, o que falta para Roberto jogar com Zico? Segundo o técnico Cláudio Coutinho, apenas uma coisa: ele desembarcar.




Minhas considerações: Roberto desembarcou no Rio, mas seu destino não foi a Zona Sul. Fez o caminho de sempre e seguiu para a Zona Norte. Sob pressão e revolta de torcedores cruzmaltinos, que já davam como certo o acordo entre Roberto e Flamengo, os mandatários do Vasco, tendo na pessoa de Eurico Miranda, à época assessor especial do presidente Alberto Pires Ribeiro, o clube de São Januário também entrou firme na disputa para trazer o camisa 10 de volta. Eurico foi à Espanha tentar uma última cartada e fazer Dinamite e esposa mudarem de ideia. O esforço foi recompensado e o Vasco conseguiu que a quantia ainda devida pelo Barcelona na negociação fosse fator decisivo no retorno do ídolo.

 

Um comentário:

  1. Boa noite. Foi bem oportuno o titulo de Sonho Rubro-Negro ... vou explicar.... no Carnaval daquele ano a Vila Isabel veio com com enredo Sonho de um Sonho. E nós, os autênticos vascainos que fomos ao Galeão receber Roberto, cantamos para a diretoria e a torcida da mulambada: " Sonhei que estava sonhando um sonho sonhado . Um sonho de um sonho magnetizado.... sonho meu tu sonhava que sonhava ... sonho meu ... eu sonhei que não sonhava mas eu sonhei" . Samba em alusão ao poema do grande vascaino Carlos Drummond de Andrade . Foi apoteótico. Como dizia Dener; Um drible bonito é melhor que um gol. Tirar essa onda com a mulambada e o Marcio Braga valeu mais que um título.

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