Falar do Sr. Abdo aguça a lembrança do kibe e do homus
maravilhosos, de um picolé sem igual e de tantas outras iguarias deliciosas. E
a vaca preta? Inesquecível para quem teve o privilégio de vivenciar aquela
época. Mais um libanês que fincou raízes, formou família e abraçou essa terra
como se aqui tivesse nascido.
Não se pode falar apenas das iguarias, há de se
reverenciar aquele jeito único e especial de tratar o próximo. A fisionomia
para quem não o conhecia mais de perto demonstrava seriedade, de pouca
conversa, mas logo era quebrada após o início da prosa. Eu adorava o picolé de
flocos, o que mais comprava. Ele conhecia muito o meu pai e depois foi se
acostumando comigo. Ao chegar à sorveteria, só ou acompanhado, ele já
dizia: “Vai de picolé de flocos”. Não tem como esquecer esses momentos
maravilhosos da adolescência.
São esses e outros personagens inesquecíveis que ajudaram
a escrever a história dos bons tempos da nossa tradicional Rua Direita. Naquele
reduto da Marechal Floriano o tempo deveria ter parado... Nada contra o mundo
moderno, mas convenhamos, bate uma saudade daquele picolé de flocos. rsrs
Quando o casal saiu de Miracema foi morar perto de
seus familiares, em Bom Jesus do Itabapoana, cidade próxima e que também faz
parte da Região Noroeste do estado do Rio. Residiram por muitos anos, até que o
Sr. Abdo veio a falecer em 2014.
Abaixo transcrevo na íntegra a mensagem recebida de Gisela
Nasser, filha do casal.
Estou compartilhando com os amigos, esta foto, já em Bom
Jesus e gozando de merecido descanso depois de muitos anos dedicados ao
trabalho. Junto vai um texto escrito por meu filho logo após seu falecimento,
no ano de 2014. Orgulhosa de sua sensibilidade ao homenageá-lo, compartilho com
vocês!
"Creio
que se houvesse alguma maneira de o meu avô voltar pra esse mundo, ele seria
desta vez uma árvore. Um Cedro do Líbano, com certeza. Raízes profundas,
representando força e eternidade. Creio que essa seria sua escolha, dando-me o
luxo de dizer que até onde eu o conhecia, ele daria um jeito de fazer tudo
igual, só que diferente. Digo diferente apenas pela diferença física entre
homem e Cedro, mas ao mesmo tempo igual, pois enquanto homem ele foi Cedro.
Veio de
longe, deixou a família em busca de uma vida melhor. Não teve os resultados
esperados e mesmo assim fincou suas raízes, que cada vez mais profundas,
formavam um alicerce forte para acolher a família que ele criaria, numa
demonstração de força e perseverança.
Trabalhou. E
se é verdade que o trabalho dignifica o homem, posso dizer o quão digno este
homem foi. Como dono de bar, deu conforto para a mulher e os filhos, e apesar
de trabalhar em uma profissão considerada pouco gloriosa, conseguiu sua fama:
modesta, porém concreta. Foi filho, marido, pai, avô.
Assim como o
Cedro do Líbano, suas raízes não interromperam seu crescimento ao encontrarem a
rocha. Abraçaram-na, tornando-se ainda mais fortes. A falta da mãe, dos irmãos
e parentes e da vida que ele possuía no Líbano, só o fez se dedicar ainda mais
à família que ele construiu no Brasil.
Mais uma vez
como Cedro, viveu muitos anos. Agora, no auge da sua vida e com a certeza de
missão cumprida, apenas ensinou. Foi sábio, carinhoso, companheiro. Talvez por
isso ele gostasse tanto do Cedro, por se identificar com ele. Talvez por isso
eu goste tanto de árvores.
Para mim,
ele se imortalizou no legado que deixou. Haverá Abdo enquanto houver Cedro. E
ouso dizer que sempre haverá Cedro, pois como se soubesse que estava fazendo
tudo certo, ele semeou para perpetuar. A semente que caiu no meu coração farei
questão de cultivar."
Saudades do seu kibe, sorvetes e do sorriso educado e aconchegante com o qual nos recebia em seu estabelecimento .
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