terça-feira, 27 de junho de 2023

2ª DIVISÃO DO RIO – AS AVENTURAS DE QUEM SONHA COM O MARACANÃ

 

Campo do Rio Branco

Nota: reportagem da revista Placar de 30/08/1985, assinada por Armando Calvano e fotos de Rodolpho Machado

 

Um louco futebol: em campo, Brigite Bardot, carneiros, galos de briga...

 

Menos de um mês depois de disputarem a final da Taça Ouro pelo Bangu, na semana passada os atacantes Pingo e Lulinha sentiram o chão sumir sob seus pés. O patrono do vice-campeão nacional, Castor de Andrade, informou que o Campo Grande, de quem o Bangu emprestara os dois jogadores no início da temporada, estava pedindo 600 milhões de cruzeiros por seus passes em definitivo. Castor não estava disposto a desembolsar tanto e, assim, eles teriam de voltar a seu clube, que disputa a Segunda Divisão do Rio de Janeiro.

Pingo não se conformou, Lulinha chegou a dizer que nesse caso preferia ficar sem clube. Voltar à Segundona, nunca! Ao contrário do que acontece em sua similar paulista, que ocupa o terceiro lugar em volume de arrecadações no país, a divisão de acesso fluminense representa para os craques mais ambiciosos uma espécie de calabouço, onde estão condenados ao exílio perpétuo dos grandes espetáculos do futebol que costumam acontecer perto dali, no Maracanã – palco que todos sonham em pisar. Povoado por dirigentes doidamente apaixonados por seus times, jogadores que se cruzam em início e fim de carreira, repleto de cenas inimagináveis numa estrutura que apesar de tudo preserva o profissionalismo. O campeonato representa por tudo isso um universo rico e fascinante. Uma espécie de folclore vivo e em permanente criação.

 

Sentado num apodrecido banco de madeira no vestiário, o atacante Zé Neto reclamava com o massagista: “Manfrini, cadê a toalha quente? Tá na hora de fazer o tratamento no joelho”. Manfrini pediu paciência: “Espera um pouco que a água está esquentando lá fora”.

Junto à entrada do vestiário, quatro tijolos sustentavam uma velha chaleira com água até a boca. No meio, ardiam alguns gravetos. Em 15 minutos, a água começou a borbulhar. Estava no ponto para umedecer a toalha desbotada. Mas logo o tarimbado massagista – dez anos de dedicação ao Rio Branco, de Campos, a terra do petróleo e da cana-de-açúcar no interior fluminense – viu-se às voltas com outro problema insólito: “A bola, cadê a bola?”, pediam os jogadores, já de roupa trocada, no centro do campo do Ypiranga.

“É mesmo, a bola...” deu-se conta Manfrini. Abriu o armário, pegou uma velha bola – mais desbotada que a toalha sobre o joelho de Zé Neto – e deu início a um sofrido movimento de vaivém na bomba de pneu de bicicleta para poder enchê-la a gosto do time. Terminado o cansativo trabalho, quicou-a três vezes antes de lançá-la por cima do alambrado para os ansiosos jogadores.

 

SAUDADE DAS MORDOMIAS

 

É assim a Segunda Divisão Profissional do Rio de Janeiro. Já indo para a terceira rodada do segundo turno, a maioria dos clubes faz o diabo para sobreviver, com média de 200 torcedores, rendas máximas de 1,5 milhão de cruzeiros e três salários mínimos mensais para os maiores craques. O primo mais pobre desta família é, sem dúvida, o Rio Branco de Campos.

Em sua bela casa próxima ao campo do Goytacaz, outro clube da cidade, o presidente de honra e tesoureiro do Rio Branco, Clóvis Arenari, tenda explicar a situação: “Como vivemos? Isso é muito simples, meu filho: nosso coração é rosa e preto (as cores do clube). Faltou dinheiro, eu, o presidente do clube, e mais uns três amigos, metemos a mão no bolso”, diz ele enquanto afaga a cabeça de um galo de briga, um dos 50 que cria nos fundos da casa. Mas o clube diversifica sua política econômica. Há um mês, a direção colocou à venda 7.000 títulos do Rio Branco e garante que 6.500 foram vendidos. O sucesso fulminante da promoção está intimamente ligado à surpreendente campanha do time, que ocupa a segunda colocação no campeonato.

Além dos artilheiros Cacholinha e Arroz, um jogador das Arábias é considerado o maior responsável por essa façanha: o zagueiro William, que começou a sua carreira no Fluminense e, de 1981 a 84, faturou cerca de 2.000 dólares por mês no Catar. Hoje, no Rio Branco, Willim lamenta que os árabes tivessem proibido os estrangeiros de atuar na região: ganha, o câmbio atual, 70 dólares por mês (menos de 500 cruzeiros) no clube campista. “Vivo de economias, meu irmão. Naquela mordomia lá dos árabes eu não gastava nada e deu para juntar um dinheirinho. Ainda bem, né?”




De Campos a Cabo Frio são mais de 2 horas de estrada.  Lá, à beira da praia e em meio a turistas que vêm do Brasil e do mundo, atraídos pelas areias alvíssimas e o mar transparente da região, fica a Associação Atlética Cabofriense, que divide a segunda colocação com o Rio Branco. E a situação se torna curiosa na medida em que a Cabofriense é o primo rico da competição.

O prefeito Alair Correia, do PMDB, certo de que no futebol encontraria uma fonte de divisas para a região, resolvei investir forte na Cabofriense. Reuniu um grupo de comerciantes da região e, assim, obteve uma receita mensal de 50 milhões de cruzeiros. Com isso, o supervisor Carlos Alberto Galvão, o “Katuca”, que já trabalhou em vários clubes grandes do Rio, pôde sair à cata de reforços. Transformou a Cabofriense numa espécie de filial do Bangu, que, por intermédio de Castor de Andrade, cedeu sete jogadores, entre eles Totonho e Marcelinho, que chegaram a ser titulares do time de Moça Bonita. Para completar a equipe, três veteranos: Paulo Verdum (ex-Botafogo), Sérgio Lima (que jogou no América do Rio, no Guarani de Campinas e no México) e Luís Paulo, (ponta-esquerda, 35 anos, que quando jogava no Flamengo, mereceu exagerados elogios de Pelé).

 

UM TRAMPOLIM

 

De Cabo Frio, ficou na equipe apenas o centroavante Val, 18 anos, considerado a maior revelação da cidade em todos os tempos. O técnico Hamilton está satisfeito. Estudioso do futebol, também com passagem pelo futebol árabe após ter-se diplomado em Educação Física, ele considera inviável a estrutura dos clubes da Segunda Divisão.

“O certo seria os times se preocuparem em revelar novos valores em vez de aproveitar os jogadores mais veteranos. Veja bem: não estou contra nenhum deles que joga aqui na Cabofriense. Eu gostaria somente que o futebol brasileiro fosse olhado de uma outra maneira, não tão imediatista. Os clubes da Segunda Divisão poderiam ser o trampolim para os jovens, ou seja, aqueles que estouram idade de juniores no Vasco, Flamengo, Fluminense, e não são aproveitados.”

No alta da serra, em Nova Friburgo, a 137 km do Rio, o técnico da Friburguense, Paulo Massa, companheiro de faculdade de Hamilton, pensa da mesma forma. E é apoiado pelo presidente Felippe Deccache, um industrial bem-sucedido da região, que não tem o menor interesse de transformar agora a Friburguense num grande clube.

“Vou contar uma verdade para você: nós nem íamos disputar esse campeonato de 1985. Só entramos mesmo porque o CND baixou aquela norma de que quem não jogasse seria rebaixado para a Terceira Divisão. Montei nosso time em um mês”, disse Deccache.

Impávido, segue à frente de todos o Campo Grande, líder absoluto da Segunda Divisão, que, se não consegue seduzir de volta seus craques Lulinha e Pingo, já tem quase a certeza que voltará a jogar, no ano que vem, contra os grandes do futebol carioca. Apesar das baixas arrecadações, o clube consegue se manter em boa situação graças à sua alta arrecadação social de clube de porte na zona rural carioca.

O Serrano, de Petrópolis, e o Mesquita, da Baixada Fluminense, também vivem, aos trancos e barrancos, da receita de seu pequeno quadro social. Ruim mesmo está a situação para São Cristóvão e Madureira, mal colocados na tabela de classificação.  Os dois, além de terem perdido quase todos os associados nos últimos anos, mal conseguem pagar as despesas do time. Como o Nacional de Caxias, cujos jogadores ganham mensalmente o equivalente a um salário mínimo. O Nacional é o último colocado. Até agora, só conseguiu dois pontos.

Mas especialmente triste é a situação do São Cristóvão. Clube de tradição no futebol carioca, com um título estadual conquistado na década de 30, hoje corre o sério risco de cair até para a Terceira Divisão, tal a fragilidade de sua equipe. O velho estádio de Figueira de Melo está praticamente abandonado e já houve jogos neste da Segunda Divisão em que apenas 20 torcedores foram ver. Para se ter uma ideia, seu jogador mais experiente – Albéris – ganha 370.000 cruzeiros por mês, pouco mais que o salário mínimo.

Sumiram até os quatro carneiros que passavam o dia a comer a grama do campo. Ninguém sabe dizer nas panelas de quem foram colocados. Sumiram, como pode acontecer com o São Cristóvão qualquer dia desses.

Assim vai a Segundona, fazendo o que pode para não desaparecer e, se possível, chamar a atenção. Em setembro, a Cabofriense vai estrear uma nova camisa, com um desenho da Brigitte Bardot no lado direito do peito. É uma homenagem à BB, que tornou conhecida internacionalmente a vizinha Búzios, distrito de Cabo Frio, ao passar, 20 anos atrás, umas férias ali com seu namorado argelino, criado no Brasil, Bob Zagury. Aliás, onde foi parar esse também?

 

Minhas considerações:

 

O Campeonato Estadual da Segunda Divisão de 1985 foi disputado pelas seguintes agremiações:

Associação Atlética Cabofriense, de Cabo Frio

Campo Grande Atlético Clube, do Rio de Janeiro

Friburguense Atlético Clube, de Nova Friburgo

Madureira Esporte Clube, do Rio de Janeiro

Mesquita Futebol Clube, de Nova Iguaçu

Nacional Foot-Ball Club, de Duque de Caxias

Clube Esportivo Rio Branco, de Campos

Royal Sport Club, de Barra do Piraí

Rubro Atlético Clube, de Araruama

São Cristovão de Futebol e Regatas, do Rio de Janeiro

Serrano Futebol Clube, de Petrópolis

Esporte Clube Siderantim, de Barra Mansa

 

Foram promovidos ao final do campeonato o Campo Grande (campeão) e Mesquita (vice-campeão) para os lugares dos rebaixados Bonsucesso e Volta Redonda.

 

sábado, 17 de junho de 2023

BITA: UM ARTILHEIRO IMPLACÁVEL

 


Silvio Tasso Lasalvia, mais conhecido como BITA, nasceu em Olinda-PE, em 11 de agosto de 1942. É o maior artilheiro da história do Náutico, com números impressionantes: 223 gols em 319 jogos.


Outro fato marcante em sua carreira é a conquista de dez títulos consecutivos do estadual pernambucano: Náutico (1963/68) e Santa Cruz (1969/72). Após conquistar o tetracampeonato estadual pelo Náutico em 1966 e ter sido o artilheiro da Taça Brasil do mesmo ano, junto com Toninho Guerreiro, do Santos, com 10 gols, Bita troca o Brasil pelo Uruguai e vai defender o Nacional, em 1967. A passagem no futebol uruguaio foi rápida e logo retornou ao Náutico.


Além de muitos prêmios como artilheiro de competições que participou, Bita conquistou o Prêmio Belfort Duarte em 1972, honraria destinada aos jogadores disciplinados. Nunca foi expulso de campo. Bita era irmão de Nado, que jogou no Vasco na segunda metade dos anos 1960.


Um câncer na face foi a causa de sua morte, em 27 de outubro de 1992, aos 50 anos, na capital pernambucana.


Vale acrescentar que o Rei Pelé em uma entrevista a um programa da TV Cultura, foi perguntado sobre os melhores times de futebol que ele já tinha visto jogar, de pronto ele respondeu: o Cruzeiro de Tostão, o Palmeiras de Ademir da Guia e o Náutico de Bita.

quarta-feira, 7 de junho de 2023

FERNANDÃO: O TRÁGICO FIM DE UM ÍDOLO ESMERALDINO E COLORADO

 


Fernando Lúcio da Costa nasceu em Goiânia no dia 18 de março de 1978. Iniciou a carreira nas categorias de base do Goiás e aos 17 anos já integrava o time principal. Sua trajetória no Goiás foi de 1995 a 2001, e retornou em 2009/10, marcando 118 gols em 308 jogos. Faz parte da galeria dos grandes artilheiros do clube Esmeraldino.  Foi pentacampeão goiano 1996/00, e bicampeão da Copa Centro-Oeste 2000/01.


No futebol francês jogou no Olympique de Marseille e Toulouse (por empréstimo). Retornou ao Brasil em 2004 para ser um dos destaques do Internacional. Sua passagem pelo Internacional foi marcante e fez dele um grande ídolo do torcedor colorado, marcando seu nome na história do clube, principalmente nas conquistas da Taça Libertadores e do Mundial de Clubes da FIFA, em 2006. Ainda foi campeão gaúcho em 2005 e 2008, e da Recopa Sul-Americana de 2007. Atuou em 190 jogos e marcou 77 gols.


Na temporada 2008/09 jogou no Qatar, no Al-Gharafa (campeão da Copa e da Liga em 2009). Vestiu novamente a camisa do Goiás e depois de uma breve passagem pelo São Paulo, encerrou sua carreira em maio de 2011.


Fernandão estava com mais quatro pessoas no momento da queda de um helicóptero, em Goiás, e não houve nenhum sobrevivente. O acidente aconteceu por volta da 1h30, quando a aeronave que transportava Fernandão caiu em um rio. Ele estava com 36 anos e vinha trabalhando como comentarista no Sportv.

segunda-feira, 5 de junho de 2023

SAPATÃO: UM ÍDOLO DO TRICOLOR BAIANO



Élcio Nogueira da Silva, mais conhecido como Sapatão, nasceu em Campos dos Goytacazes-RJ, em 15 de outubro de 1947. Começou sua trajetória nas categorias de base do Campos Atlético Associação, de sua cidade natal.

Seu desempenho na zaga do roxinho campista o levou aos quadros amadores do Flamengo, mesmo período em que o apelido de "Sapatão" ganhou força entre os companheiros de clube. Após um jogo amistoso contra o Fluminense de Feira de Santana, o clube baiano manifestou interesse pelo jovem zagueiro Rubro-Negro. Foram apenas três jogos pelo Flamengo, entre julho de 1967 e maio de 1968.

Campeão baiano de 1969 defendendo as cores do Fluminense, seu desempenho chamou a atenção do Bahia, que contratou o promissor zagueiro em 1970. Ficou no tricolor baiano até o início de 1972, quando os dirigentes do Santa Cruz, impressionados com seu futebol, compraram seu passe. Nesse mesmo ano conquistou o título pernambucano.

                                                               O 2º em pé, a partir da esquerda. Campeão baiano de 1969.

Não demorou muito para o Bahia trazer seu ex-zagueiro de volta e corrigir a falha de sua saída. Heptacampeão baiano entre 1973 e 1979, Sapatão foi um dos símbolos de um período marcante na história do clube. Vestiu a camisa do Bahia em 450 jogos e marcou 12 gols. É um dos grandes ídolos do tricolor baiano.

Permaneceu no Bahia até 1980 – quando se transferiu para a Catuense – equipe que encerrou a carreira em 1981. Apaixonado pela “boa terra” fixou residência em solo baiano.

Sapatão era hipertenso e sofria de problemas renais. Faleceu em 05 de junho de 2020, na capital baiana, aos 72 anos.