Montevidéu, maio/1972. Club Jackson, Parque Maldonado,
onde os jogadores campeões mundiais em 1950, na tragédia do Maracanã, 16 de
julho, se reuniam - os que ainda vivem continuam se reunindo lá, especialmente
na data da final daquela Copa. Passei por lá a caminho de Buenos Aires, para
cobrir um jogo Independiente x São Paulo, pela Libertadores. Cheguei, com o
fotógrafo Fernando Pimentel e fomos para o Hotel Vitória. De lá, liguei para o
jornal La Manãna para falar com o amigo e grande jornalista Franklin Morales.
Ele não estava, mas seu colega me atendeu muito bem. Disse a ele que queria
conversar com Obdulio Varella e se sabia onde encontrá-lo. Ele riu, disse que
eu e todos os brasileiros que apareciam por lá, desde 1950, queriam falar com
Obdulio, mas nenhum conseguia. "Ele não dá entrevistas". Mas me deu o
caminho. Club Jckson, a partir das 20 horas. Rumamos para lá.
Por alguns minutos fiquei de longe vendo-o jogar
bocca. Depois me aproximei de algumas pessoas. Desejei boa noite a eles, que
logo quiseram saber o que eu pretendia. Disse e as vi sorrir também. Depois que
Obduio executou mais uma jogada, um de seus amigos mandou o recado: "Negro,
esse moço, jornalista brasileiro, quer falar com você". Obdulio levantou
ligeiramente a cabeça, me olhou rapidamente e continuou jogando, sem uma única
palavra. Fui aconselhado a ir embora, porque perdia meu tempo. Pimentel também
propôs voltarmos ao hotel, mas eu não tinha nada a fazer nem a perder.
Continuei olhando o jogo, acho que por mais umas duas horas. De repente, Obdulio
veio em minha direção e perguntou o que eu queria. Falei que Zezé Moreira, meu
conterrâneo, me havia dito que... Mas fui rapidamente interrompido: “Ele não
sabe nada de futebol. Estragou nossos times. É um retranqueiro...".
Concordei de imediato. Não estava ali para falar de Zezé Moreira, grande
técnico, mas para conversar com ele, Obdulio Varella, que tinha feito tantos
brasileiros chorar.
Uns segundos de pausa e ele perguntou: "o que
você bebe". Respondi que bebia cerveja e ele disse que bebia uísque,
convidando-me para sentar. Ordenou que fôssemos servidos e o papo rolou por
horas. Seus amigos, campeões do mundo, balançavam a cabeça não acreditando no
que viam e ouviam. Alta madrugada, quando o assunto futebol tinha esgotado, ele
começou a falar de política e a criticar o governo. Preocupados, seu amigos
disseram que tinha acabado a cerveja e o uísque. Sem dar bola para eles,
Obdulio me chamou para continuar a conversa numa churrascaria que ficava perto
do estádio Centenário - que permanecia aberta na madrugada - conhecida dos
brasileiros como Cancha de Maidana. Apesar da azia já estar presente - muita
cerveja sem nada comer - topei o convite. Mas seus amigos me aconselharam a
mudar de ideia. "Moço, você tem muita sorte. Ele nunca conversou com
nenhum jornalista brasileiro, mas não abuse. Ele é tupamaro, mas é respeitado
pela polícia, mas você..." Fui curar a azia no hotel.
Nota: mais uma sacada de “mestre” do “MESTRE” José
Maria Aquino, um dos nomes mais respeitados do jornalismo esportivo.
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