segunda-feira, 15 de junho de 2020

MARINHO: UMA HISTÓRIA COM INÍCIO E FINAL TRISTE



Nascido numa área pobre do bairro de Santa Ifigênia, em Belo Horizonte, em 23 de maio de 1957, Marinho era o sétimo filho de uma lavadeira que, ao invés de roupas, lavava cadáveres no necrotério da polícia mineira. O garoto passou fome, passou frio, foi catador no lixão de Belo Horizonte, começou a andar com más companhias, até ser internado num reformatório da polícia em Pirapora. 

A vida de sofrimentos só começou a melhorar quando um massagista do Atlético Mineiro o levou para treinar nas categorias de base do “Galo”. Não havia a certeza que Marinho daria certo como jogador, mas era uma esperança de livrá-los das ruas, dos bares e do cigarro, que já começava a usar com 12 anos. Com a bola nos pés, o garoto logo agradou. Galgou espaço no clube alvinegro e em 1975 – com 18 anos – era transformado em profissional, pelas mãos do técnico Telê Santana. 

Em 1976, foi convocado para a Seleção Brasileira de amadores que iria disputar os Jogos Olímpicos de Montreal. A carreira deslanchava, mas Marinho começava a se perder na fartura, nos prêmios, nos bichos. Com farra todos os dias, natural que o seu futebol fosse decaindo, ficando assim na reserva do timaço que o Atlético tinha montado e, em 1979, fosse vendido para o América de São José do Rio Preto, onde teria que, praticamente recomeçar a carreira. Atuou em 118 jogos e marcou 21 gols com a camisa do Galo.

No interior paulista, Marinho brilhou. Foi vice-artilheiro do Campeonato Paulista de 1980; foi convocado para a Seleção Brasileira de Novos de 1981 e regressou para o Atlético Mineiro em 1982, por empréstimo de cinco meses.
AMÉRICA (SP) - 1981
EM PÉ: PAULO CÉSAR, BRÁS, BETO, LACERDA, JORGE LIMA E BERTO;
MARINHO, ROTTA, PAULINHO CASCAVEL, SERGINHO ÍNDIO E RÔMULO
Marinho era cobiçado por grandes clubes. Grêmio, Internacional, Santos, Cruzeiro, Flamengo queriam o passe do ponta-direita, mas o presidente do América (SP) não liberava o jogador por quantia nenhuma. Até que o Patrono do Bangu, Castor de Andrade, foi até São José do Rio Preto e fechou a negociação, pagando 40 milhões de cruzeiros e mais o passe do ponta-direita Dreyfus. Em janeiro de 1983, Marinho chegou ao Rio com 300 mil cruzeiros no bolso e hospedagem no Hotel Plaza, por ordem do “homem”. 

No Bangu, Marinho demorou um tempo para se adaptar e deslanchar. Estreou durante o Campeonato Brasileiro da 2ª Divisão de 1983 e passou em branco. Só foi marcar o seu primeiro gol com a camisa alvirrubra num amistoso contra o Botafogo da Paraíba, em João Pessoa. Mas, depois que se adaptou ao clima, ao grupo, foi um dos grandes nomes do time na campanha do Campeonato Carioca naquele ano. O time chegou em terceiro lugar, Marinho fez partidas incríveis, principalmente uma contra o América, no Maracanã, quando marcou dois gols. A vida começava a melhorar.

Em 1984, fez um péssimo Campeonato Brasileiro da 1ª Divisão. No Carioca, foi o herói de uma vitória por 2 a 1 sobre o Vasco, ao anotar os dois gols. Com boas apresentações, Marinho era todo sorriso, tido como o jogador mais irreverente do futebol carioca. Soma-se a isto os bichos gordos de Castor de Andrade, que propiciaram a Marinho morar em um casarão no bairro de Jacarepaguá. 

Seu grande ano foi realmente 1985, quando foi eleito o melhor jogador do Campeonato Brasileiro, ganhando a Bola de Ouro da revista Placar. O hábil ponta-direita colocou o time nas costas durante a fase final e levou o Bangu até a decisão contra o Coritiba. Antes disso, tinha acabado com o Brasil de Pelotas, nas semifinais, anotando dois gols belíssimos. O craque tinha a certeza do título, assim como as 91 mil pessoas que lotaram o Maracanã naquela noite de quarta-feira. Autor de 16 gols naquele Campeonato, Marinho era o vice-artilheiro do Brasileirão. Em campo, jogou tudo que sabia. Com o placar final em 1 a 1, a decisão foi para a cobrança de pênaltis.  Marinho ainda converteria sua cobrança na hora das penalidades, mas o título fugiu do Bangu. 

Mesmo valorizado, com o Flamengo tentando comprá-lo, Marinho continuou no Bangu para o Campeonato Carioca. Fez outra grande campanha até chegar à final contra o Fluminense. O ponteiro fez 1 a 0, gol de cabeça logo aos 4 minutos. O tricolor virou. No último minuto, Marinho fez um lançamento de um campo a outro para Cláudio Adão aproveitar. O centroavante foi derrubado dentro da área e o árbitro José Roberto Wright não marcou o pênalti. 

Apesar de tanto drama, Marinho era um profissional e em 1986 viveu outra frustração. Foi convocado pelo técnico Telê Santana para os treinamentos da Seleção Brasileira. Estava no grupo que poderia ir à Copa do Mundo do México. Mas, não foi aproveitado. Fez apenas dois amistosos, chegou a marcar um gol de cabeça diante da Finlândia, mas foi cortado pelo treinador. O craque estava acabado. Perdeu a cabeça. Foi aos jornais e denunciou Telê como “racista”, passou a peregrinar pelos bares, voltou a beber, a fumar, perdeu a alegria de jogar futebol. Pelo Bangu, fez uma temporada apagada. 

Voltou a jogar seu bom futebol em 1987, garantindo para o Bangu o título da Taça Rio, referente ao 2º turno do Campeonato Carioca e ainda ajudou o clube alvirrubro a chegar às semifinais do Campeonato Brasileiro, perdendo para o Sport. No início de 1988, Castor de Andrade presenteou” o bicheiro Emil Pinheiro, do Botafogo, com os passes de Marinho, Mauro Galvão e Paulinho Criciúma. A negociação não envolveu dinheiro e sim muitos pontos de bicho que eram de Emil passaram a ser de Castor. No Botafogo, Marinho poderia decolar se não fosse outra tragédia pessoal. Durante o Carnaval daquele ano, quando dava entrevista a uma emissora de TV em sua mansão em Jacarepaguá, o filho Marlon, de um ano e sete meses, caiu dentro da piscina, ninguém viu e o garotinho morreu afogado. A decepção foi enorme. Em pouco tempo, Marinho estava separado da esposa, tinha largado os treinos, abandonara a mansão, passara a dormir dentro do Mercedes-Benz que tinha na época. Vivia bebendo e sequer tomava banho. 

EM PÉ: GILMAR, OLIVEIRA, FÁBIO, MAURO GALVÃO, PEDRINHO E
MÁRCIO NUNES; ARTHURZINHO, MARINHO, PAULINHO CRICIÚMA,
TÓBI E COSME

No Botafogo, jamais conseguiu se fixar entre os titulares e durante o título carioca do alvinegro em 1989, Marinho disputou apenas três jogos. Estava descendo a ladeira. Jamais ganharia os mesmos salários de antes. O alvinegro não queria mais o “problemático” Marinho e ele voltou ao Bangu no segundo semestre de 1989. Foi agraciado com uma vaga na excursão à Europa – sendo reserva de Gilson na ocasião -, mas teve poucas chances durante o Campeonato Brasileiro da 2ª Divisão daquele ano. Em 1990, voltou para outra paixão antiga: o América de São José do Rio Preto. No final do ano, retornou ao Bangu para a disputa da Taça Adolpho Bloch. Depois, foi jogar no desconhecido San José Oruro, da Bolívia, sua única experiência em clubes do exterior.

O técnico Moisés tentou trazê-lo para o Bangu, dar mais uma chance ao jogador em 1993, mas aos 35 anos e após uma vida desregrada, Marinho fez apenas dois amistosos. Em 1994, novamente Moisés tentou trazê-lo de volta ao mundo do futebol, novamente Marinho decepcionou, realizando apenas um jogo pelo alvirrubro durante o Campeonato Brasileiro da 2ª Divisão. A carreira já tinha acabado, mesmo assim, ainda assinou contrato com o Entrerriense, em 1995 e com o São Cristóvão, em 1996. Em 1997, com 40 anos, fez suas últimas partidas pelo Bangu durante o Campeonato Carioca. Era um reserva de luxo, que entrava quando o jogo já estava decidido, só para o deleite dos torcedores mais saudosistas. 

O “herói” dos anos 80, o jogador que foi o melhor do país em 1985 e que tinha enfrentado tantas adversidades na vida, parava definitivamente. O dinheiro que ganhou nos tempos fartos de Castor acabara, surrupiado por más companhias e inúmeras bebedeiras. Marinho estava pobre de novo e passou a treinar times das categorias de base do próprio Bangu, do Ceres (RJ) e do Juventus (RJ). Ensinava aos garotos que era preciso ter comprometimento com o futebol, não perder a cabeça como ele e valorizar as oportunidades que aparecessem. Era o ídolo Marinho, o décimo maior artilheiro do Bangu, com 83 gols em 227 jogos.



Após vários dias internado em um hospital de Belo Horizonte, para tratamento de um câncer no pâncreas, mas que depois se espalhou para outros órgãos, Marinho faleceu no dia 15 de junho de 2020, aos 63 anos. 

Fonte: Bangu.net e acréscimos.


7 comentários:

  1. A vida é assim, ela nos dá uma oportunidade e temos que agarrar e segurar firme porque caso contrário tudo escapa entre os dedos e acabamos ficando sem nada. Que sirva de exemplo para muitos, não somente para jogador de futebol porque independente de ganhar pouco ou muito é preciso economizar porque na hora da dificuldade ninguém bate na sua porta para lhe entender a mão.

    ResponderExcluir
  2. Lamentável que o grande Marinho tenha ido! 😭
    Que Deus o acolha em Seu Reino!

    ResponderExcluir
  3. Que história triste. Me recordo da morte do filho dele. Descanse em paz, Marinho.

    ResponderExcluir
  4. Triste história mas Marinho teve tudo nas mãos e conseguiu perder tudo que conquistou com o futebol , fica a lição para os mais jovens.

    ResponderExcluir
  5. Sem dúvida, um jogador que mesmo tendo um fim nada romancesco, deixou sua marca na história do nosso futebol.

    ResponderExcluir
  6. É um fato doloroso que os novos jogadores precisam saber. Marinho foi um bom jogador, mas sem as devidas orientações dos amigos, dirigentes e família acabou de forma trágica. Deus já lhe deu o descanso eterno.

    ResponderExcluir