Imagem do telhado destruído do Hospital
Nota: transcrito na íntegra do Jornal do Brasil,
edição 16 de junho/1988, matéria assinada por Oscar Valporto e fotos de
Chiquito Chaves.
Pedras de gelo do tamanho de bolas de
tênis destelham casas e arruínam Miracema.
Primeiro foi a ventania, depois a
tempestade de granizo com pedras de gelo do tamanho de bolas de tênis e, finalmente,
a chuva rápida. Tudo isso durou menos de meia hora, no final da tarde de
terça-feira, dia 14 de junho, mas bastou para transtornar a vida da pequena
cidade de Miracema, no noroeste do estado. Os 130 pacientes do agora destelhado
Hospital de Miracema foram transferidos para outras clínicas da região. Mais de
80% da lavoura de jiló, tomate e pimentão foi destruída e 3 mil e 500 pessoas –
10% da população local – tiveram suas casas atingidas.
“Parecia o fim do mundo”, disse Maria
Dolores da Silva, 67 anos, uma das últimas pacientes transferidas do hospital. Além
de perder as telhas, o hospital teve as enfermarias, o centro cirúrgico e o
depósito de remédios completamente alagados. A violência da tempestade de
granizo destruiu também tetos e paredes das casas que estão sendo construídas
pela prefeitura em convênio a SEAC (Secretaria Especial de Ação Comunitária).
“Boa parte da cidade vai precisar de um longo trabalho de reconstrução”, afirma
o prefeito Ivany Samel (PMDB), que decretou estado de calamidade pública.
Após uma noite sem energia elétrica e
com muita gente ainda em pânico, o sol apareceu ontem para alívio dos
moradores, que fizeram mutirão para consertar casas e tentar salvar as coisas
atingidas pela tempestade. A área do hospital e o morro da Cehab foram as
regiões da cidade mais atingidas pelo granizo. Nas ruas José Monteiro de Barros e Melquíades
Picanço – duas longas avenidas que levam ao hospital – os moradores colocaram
móveis, eletrodomésticos, colchões e roupas para secar. “O pior são os buracos
que o granizo fez no teto. Ainda bem que ninguém se machucou”, disse o
representante comercial José Carlos Aguiar, que trocava telhas quebradas.
As casas de telhas francesas (as mais
comuns) foram menos afetadas que as telhas de amianto. O balconista Robson José
da Silva teve o telhado de casa totalmente destruído. Não sobrou nenhuma telha
de amianto inteira. Quando a chuva de granizo começou e as pedras e pedaços de
telha caiam dentro da casa, Robson colocou a mesa sobre a cama para se proteger
com a avó e a esposa. “Foi uma loucura, parecia que o céu ao desabar”, contou. Os
moradores do morro da Cehab passaram a noite no Ciep de Miracema e depois
voltaram à escola para receber comida e remédios distribuídos aos desabrigados.
A prefeitura distribuiu telhas para a reconstrução
das casas, mas o número era insuficiente para tantos tetos destruídos.
Os estragos, porém, não ficaram
restritos a essa parte da cidade. O telhado do galpão do campo de pouso de
Miracema foi arrancado pela tempestade e o monomotor PP-RHQ foi bastante
danificado nas asas. Um ultraleve também
foi atingido. A cobertura da Praça de Esportes Gerson Alvim Coimbra – de zinco,
como o telhado do galpão – também foi parcialmente destruída. O granizo não
chegou a afetar a Biblioteca Municipal, mas a chuva alagou as salas, e os
funcionários foram obrigados a retirar parte dos livros, colocados na grama na
tentativa que o sol os salvasse.
“O prejuízo total deve passar de CZ$
500 milhões”, calcula o prefeito, que espera a ajuda do governo do estado. Além
das lavouras de tomate, jiló e pimentão, o município perdeu 30% de sua safra de arroz, cerca de 120 mil sacas
que ainda não tinham sido colhidas.
Os campos passaram a noite cobertos
de gelo, que só desapareceu com o sol da manhã. “Para os outros pode parecer
bonito, mas, para nós, o gelo representa a morte”, disse o lavrador Antônio
José de Souza.
Hospital virou pandemônio
O teto estava como se fosse desabar.
Algumas janelas quebraram. A luz acabou. A água começou a descer pelas paredes.
Os pacientes entraram em pânico e começaram a gritar e chamar pelos
enfermeiros. Os funcionários tentavam em vão dar ordem à confusão e acalmar os
doentes. Os bebês choravam no berçário. “Foi um pandemônio. Eu nunca tinha
visto uma tempestade de granizo igual em anos e anos nesta região”, desabafou o
provedor do Hospital, Darcy Aníbal, que calculava o prejuízo da
instituição em mais de CZ$ 100 milhões.
Conveniado com o INAMPS, o Hospital
de Miracema é um dos melhores do noroeste e tem 200 leitos e um centro
cirúrgico. Atende por mês cerca de 7 mil pessoas. Toda essa gente – pobres na
maior parte – vai ficar sem atendimento, pois o hospital ficou desativado. Todos
os pacientes foram transferidos e a direção ainda não sabe quando (e como) vai
consertar os danos.
Marcos Aníbal mostra o gelo acumulado na tempestade.
“Foi uma madrugada horrível”, contou
o estudante Marcos Aníbal. Durante a madrugada, enfermeiros, médicos e
funcionários prepararam a transferência dos pacientes internados para a Casa de
Saúde São Sebastião, para o Hospital Manuel Ferreira, em Pádua, e para o
Hospital Maria Elói, em Palma. O enfermeiro-chefe Ronald Siqueira foi atingido
na cabeça por uma pedra de gelo.
Ontem de manhã, as marcas da
tempestade no hospital eram as mais fortes de toda a cidade. Os funcionários
tiravam água do centro cirúrgico e das enfermarias. As instalações elétricas
estavam danificadas. Todos os pavilhões ficaram com poucas telhas. Gazes,
algodão, gesso, comprimidos, enfim, boa parte do depósito de medicamentos ficou
imprestável. No meio de tanta confusão, a pessoa mais tranquila do hospital era
a pequena Tamires, de apenas um ano, internada por subnutrição. “Ela não chorou
nem um segundo, nem mesmo na hora da tempestade, quando todas as crianças
começaram a chorar”, contou a enfermeira Rosilene César da Silva.
Minha casa era de Lage graças a Deus. Abrigue toda minha família na minha humilde casa bem pequena. Bastante gente. Mas deu para abrigar e alimentar todos.
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