domingo, 29 de julho de 2018

O QUE PASSOU, PASSOU - POR JOSÉ ERASMO TOSTES


Nos primeiros dias do ano, percorro as ruas da cidade, olho as vitrines das lojas, vejo televisões de todos os tipos e tamanhos, vejo aparelhos de som com CD que roda horas e mais horas, telefones celulares, máquinas de lavar roupas, frízer de todos os tipos, carros, computadores, parabólicas e outras modernidades.

Transporto-me ao passado, nos idos anos 40 e 50, e vejo as ruas sem calçamento, os carros de bois com suas toadas, as charretes a transitar com fazendeiros e sitiantes, caminhões Ford e International, carros de passeio das marcas Mercury, Oldsmobile, Chevrolet, Pontiac; as bicicletas Philips, Sieger e Caloy. Ouvíamos as músicas com Orlando Silva, Vicente Celestino, Albenze Perronio, Jararaca e Ratinho, Emilinha Borba e Marlene. Tomávamos Vinho Reconstituinte Silva Araújo, Emulsão de Scott, rum creosotado, injeção de gadusam.

As bandas 15 de Novembro e 7 de Setembro tocavam no coreto do jardim, os bailes com as orquestras do Severino Araújo no Aero Club e no Salão Primavera, o cineminha do José de Assis, as tabuletas do Cinema 7 e do 15 anunciando os filmes em série, a Deusa do Joba, o Arqueiro Verde com Victor Jory, os faroestes com Bil Eliot. Rapazes usando óleo de lima e glostora no cabelo, os perfumes Madeira do Oriente e Leite de Rosas.

Os rádios eram chamados de rabo quente: precisavam esquentar para funcionar. Os bancos do jardim eram de madeira, tropas de burros carregadas de café. As torres da igreja matriz eram pequenas e caiadas de branco, as bonecas eram de pano e os brinquedos de madeira. Caneta Park, lousas, canetas tinteiro. Os armazéns eram de secos e molhados, hoje são supermercados. Existiam mais alfaiates e mais sapateiros. Os vereadores não tinham remuneração, os médicos vinham em nossas casas, os telefones ficavam pendurados na parede e tínhamos que tocar uma manivela e pedir o número à telefonista. Cuecas samba-canção e calça boca de sino, suspensórios, guarda-pós, sapato solão; fogão a lenha, panelas de ferro. Esperávamos o trem na estação, o casamento era duradouro, o soldado de nome Atleta com suas botas e perneiras lustrosas, o guaraná e a groselha do Lucas, ferro de passar roupa à brasa e o banho de bacia.

E nesse passar do tempo procuramos fabricar o mel das nossas alegrias, tentando saborear as pequenas felicidades que, às vezes, absorvemos durante o tempo em que convivemos com as pessoas de nosso relacionamento, e, ao começar o ano novo, pedimos a Deus que seja de paz. Que os jovens possam desfrutar de todos os bens que a vida moderna lhes oferece, que o futuro reserve para nós, os mais velhos, somente boas lembranças do que já vivemos. Que seja como o refrão da música: “O que passou, passou / Hoje não volta mais / Na minha Rua Direita / Os antigos carnavais”.

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